segunda-feira, 22 de março de 2010

Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espeço, a figura dela

Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço, a figura dela,

E vendo-a sempre de maneiras diferentes do que a encontro a ela.

Faço pensamentos com a recordação do que ela é quando me fala,

E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua semelhança.

Amar é pensar.

E eu quase que me esqueço de sentir só de pensar nela.

Não sei bem o que quero, mesmo dela, e eu não penso senão nela.

Tenho uma grande distracção animada.

Quando desejo encontrá-la

Quase que prefiro não a encontrar,

Para não ter que a deixar depois.

Não sei bem o que quero, nem quero saber o que quero. Quero só Pensar nela.

Não peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar.



Alberto Caeiro





Fernando Pessoa escreveu este poema e assinou com o nome de um dos seus heterónimos, Alberto Caeiro. Referindo-se a uma mulher que lhe tira o sono, Alberto Caeiro vê este “ela” de muitas maneiras menos a verdadeira, e ele transforma-a à sua semelhança, só consegue pensar que amá-la é tê-la no pensamento e idealiza-a à sua maneira. De tanto pensar nela ele já não sente, só pensa. Este misto de emoções leva o poeta a não nutrir qualquer sentimento por ela, mas trazê-la sempre no pensamento. Escolhi este poema por mostrar que muitas das vezes, os pensamentos que formamos de alguém não passam disso, são mais fortes do que o sentimento na realidade.

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